quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Análise da música - Se eu fosse teu patrão

Análise da música de Chico Buarque - Se eu fosse teu patrão

Eu te adivinhava
E te cobiçava
E, te arrematava em leilão
Te ferrava a boca, morena
Se eu fosse o teu patrão
Aí, eu tratava
Como uma escrava
Aí, eu não te dava perdão
Te rasgava a roupa, morena
Se eu fosse o teu patrão
Eu te encarcerava
Te acorrentava
Te atava ao pé do fogão
Não te dava sopa, morena
Se eu fosse o teu patrão
Eu encurralava
Te dominava
Te violava no chão
Te deixava rota, morena
Se eu fosse o teu patrão
Quando tu quebrava
E tu desmontava
E tu não prestava mais não
Eu comprava outra, morena
Se eu fosse o teu patrão
coro feminino):
Pois eu te pagava direito
Soldo de cidadão
Punha uma medalha em teu peito
Se eu fosse o teu patrão
O tempo passava sereno
E sem reclamação
Tu nem reparava, moreno
Na tua maldição
E tu só pegava veneno
Beijando a minha mão
Ódio te abrandava, moreno
Ódio do teu irmão
Teu filho pegava gangrena
Raiva, peste e sezão
Cólera na tua morena
E tu não chiava não
Eu te dava café pequeno
E manteiga no pão
Depois te afagava, moreno
Como se afaga um cão
Eu sempre te dava esperança
D'um futuro bão
Tu me idolatrava, criança
Seu eu fosse o teu patrão
Mas se tu cuspisse no prato
Onde comeu feijão
Eu fechava o teu sindicato
Se eu fosse o teu patrão


A letra da música “Se eu fosse teu patrão”, escrita pelo cantor e compositor Chico Buarque de Holanda também faz também uma referência ao período colonial brasileiro, assim como a outra canção analisada anteriormente.
Pode ser analisada a partir das obras de Caio Prado Júnior e Gilberto Freyre, além de outros autores.
Os autores citados fazem referências ao tratamento destinado às mulheres na exploração no período colonial, sendo que qualquer ato que o escravo cometesse que fosse considerada infração eram vítimas de severos castigos físicos.
No que tange à mulher, como aborda no conteúdo da música por completo, as mesmas, além de castigos físicos, eram vítimas de abusos sexuais. Um grande exemplo do trabalho escravo na zona rural é a utilização da mão-de-obra dos negros cativos nas regiões açucareiras.
A música representa uma espécie de fetiche de dominação sexual, mas que tem por detrás uma submissão de fato.
Freyre expõe uma análise detalhada no livro casa Grande & Senzala, sobre o papel feminino; as mulheres brancas são dadas como submissas, embora fiquem evidenciadas manifestações de seu poder o que é relevado, por exemplo, nos maus tratos infligidos às escravas suspeitas de atrair a atenção de seus maridos. O escritor ressalta ainda que,

“(...) Nunca numa sociedade aparentemente européia, os homens foram tão sós no seu esforço, como os nossos no tempo do Império; nem tão unilaterais na sua obra política, literária, científica. Unilaterais pela (...) falta de mulher (...) colaboradora do marido, do filho, do irmão, do amante (...)”

Assim Freyre expõe que no período colonial, a cidadania foi negada à quase totalidade da população; porém, os mais afetados foram os escravos negros provenientes do continente africano. A condição da mulher brasileira era extremamente inferior que sua posição na escala social. As relações entre os homens e as mulheres e a conseqüente posição da mulher na família e na sociedade constituem parte de um sistema de dominação mais amplo.
Caio Prado Junior faz a mesma análise alegando que a situação da mulher no Brasil colonial era de extrema opressão social, econômica ou familiar.
Assim sendo, é perceptível que tantos as obras dos autores citados em relação à análise da canção de Chico Buarque estão bem co-relacionadas à situação de discriminação pela qual a mulher brasileira tem sofrido historicamente.


WÉLLIA PIMENTEL SANTOS

Um comentário:

  1. Esta música só poderia ter sido composta por Chico Buarque, vi nesta obra um pouco de Leite Derramado, expondo uma analogia que a discriminação tem vários traços, como a de dominação sexual pura e simplesmente, no caso específico da música. Perece expressar mais a dominação sexual sem a distinção de cor. A mulher em questão lembra muito Chica da Silva.

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